UM CASO DE SUCESSO? POLÍTICAS NEOLIBERAIS, SETOR EXTRATIVO E CORPORAÇÕES PRIVADAS ENQUANTO AGENTES DE DESENVOLVIMENTO EM MOÇAMBIQUE

Autores

  • Isabella Lamas CES/Universidade de Coimbra

DOI:

https://doi.org/10.25247/2447-861X.2018.n245.p464-495

Palavras-chave:

Moçambique. Recursos Naturais. Corporação Multinacional. Instituições financeiras internacionais. Neoliberalismo.

Resumo

Segundo o Banco Mundial, a extração dos recursos naturais é uma possibilidade única de financiamento rápido do desenvolvimento econômico e da redução de pobreza, principalmente nos países do Sul Global. Ao contrário dos países centrais, que implementaram progressivamente políticas neoliberais principalmente a partir dos anos 1970, Moçambique apresenta uma trajetória econômica enquanto país independente ainda muito recente. O país começou a implementar reformas de ajuste estrutural do Banco Mundial e do FMI a partir de 1987, com o Programa de Reabilitação Econômica (PRE), que marcou a sua transição para uma economia de mercado. A estabilidade dos indicadores políticos e econômicos no período pós-guerra fez com que Moçambique fosse retratado como um caso de sucesso pelo FMI, Banco Mundial e comunidade de doadores internacionais. O recente expressivo crescimento econômico do país foi impulsionado pela grande quantidade de investimento estrangeiro direto destinada à implementação de megaprojetos no setor extrativo. Neste contexto, a corporação multinacional brasileira Vale S.A. ganhou, em 2004, uma concessão para extração de carvão na Província de Tete. A partir de evidências empíricas da atuação socioambiental da Vale no país, argumenta-se que o processo de neoliberalização gerou uma abertura na governança para que empreendedores privados passassem a atuar enquanto agentes centrais na promoção do desenvolvimento local. Apesar disso, nos arredores das operações da Vale é possível observar espaços normalmente caracterizados por baixos níveis de desenvolvimento humano e conflitualidade latente, o que acentua o paradoxo central da economia política moçambicana contemporânea: crescimento econômico com aumento da pobreza e da desigualdade.

Biografia do Autor

Isabella Lamas, CES/Universidade de Coimbra

Doutoranda em Relações Internacionais no programa Política Internacional e Resolução de Conflitos do Centro de Estudos Sociais e da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra.

Referências

AIAV. Relatório de Insustentabilidade da Vale 2012. Articulação Internacional dos Atingidos pela Vale. Rio de Janeiro, 2013.

ASTILL-BROWN, Jeremy; WEIMER, Markus. Moçambique: Equilibrando o Desenvolvimento, a Política e a Segurança. Londres: Chatham House, 2010.

BANCO MUNDIAL. Manual de Operações do Banco Mundial sobre Reassentamento Involuntário. Banco Mundial. Washington, 2001a.

BANCO MUNDIAL. OP 4.12 - Involuntary Resettlement. The World Bank. Washington, 2001b.

BANCO MUNDIAL. Generating Sustainable Wealth from Mozambique’s Natural Resource Boom: World Bank Mozambique - Policy Note. World Bank. Maputo, 2014.

BANCO MUNDIAL. Actualidade Económica de Moçambique: Uma Economia a Duas Velocidades. Banco Mundial IBRD-IDA. Washington DC, 2017a.

BANCO MUNDIAL. Extractive Industries. Online, 2017b. Disponível em: < http://www.worldbank.org/en/topic/extractiveindustries >. Acesso em: 15 de agosto de 2017.

BANCO MUNDIAL. Nova estratégia do Grupo Banco Mundial busca diversificação do crescimento em Moçambique. Series Nova estratégia do Grupo Banco Mundial busca diversificação do crescimento em Moçambique, Online, disponível em: <http://www.worldbank.org/pt/news/press-release/2017/04/27/new-world-bank-group-strategy-seeks-growth-diversification-in-mozambique >. Acesso em: 15 de agosto de 2017.

BANCO MUNDIAL. World Development Indicators - 2017. World Bank Group. Washington DC, 2017d.

BESTE, Jason; PFEIFFER, James. Mozambique’s Debt and the International Monetary Fund’s Influence on Poverty, Education, and Health. International Journal of Health Services, v. 0, n. 0, p. 1-16, 2016.

BNDES. Apoio às Micro, Pequenas e Médias Empresas. BNDES. Brasília, 2013.

BRITO, Luís de; CHIVULELE, Fernanda Massarongo, Eds. Economia, Recursos Naturais, Pobreza e Política em Moçambique: Uma colectânea de textos. Maputo: IESEed, 2017.

CASTEL-BRANCO, Carlos Nuno. Growth, capital accumulation and economic porosity in Mozambique: social losses, private gains. Review of African Political Economy, v. 41, p. 26-48, 2014.

CASTEL-BRANCO, Carlos Nuno. Capitalizando o Capitalismo Doméstico: Porosidade e Acumulação Primitiva de Capital em Moçambique. In: BRITO, L. D.;CASTEL-BRANCO, C. N., et al (Ed.). Desafios para Moçambique 2015. Maputo: IESE, 2015. p.123-156.

CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO ECONÔMICA. Valorização do carvão. Ministério do Desenvolvimento e Planificação Econômica, v. 2, n. 77, 1977.

COX, Robert. Critical Political Economy. In: HETTNE, B. (Ed.). International Political Economy: Understanding Global Disorder. London: Zed Books, 1995. p.31-45.

CUNGUARA, Benedito. An exposition of development failures in Mozambique. Review of African Political Economy, v. 39, n. 131, p. 161-170, 2012.

DIAGONAL URBANA. Plano de Acção para Reassentamento - Moatize Parte I. Maputo, 2007.

DUFFIELD, Mark. Global Governance and the New Wars. Londres: Zed Books, 2001.

FAEL, Baltazer; CORTEZ, Edson. Controlo da corrupção não foi prioridade na agenda da governação no período 2005 - 2013. CIP Newsletter - Boa Governação Transparência e Integridade, v. 19, p. 1-9, 2013.

HANLON, Joseph. Mozambique: ‘the war ended 17 years ago, but we are still poor’. Conflict, Security & Development, v. 10, n. 1, p. 77-102, 2010.

HANLON, Joseph; SMART, Teresa. Do bicycles equal development in Mozambique? Suffolk: Boydell & Brewer, 2008.

HARVEY, David. A Brief History of Neoliberalism. Nova York: Oxford University Prtrdd, 2005.

HUMAN RIGHTS WATCH. What is a House Without Food? - Mozambique's Coal Mining Boom and Resettlements. Human Rights Watch. Nova York, 2013.

IDA. Mozambique: From Post-Conflict Recovery to High Growth. World Banck. Washington DC, 2009.

IFC. IFC Handbook for Preparing a Resettlement Action Plan. Washington: The International Finance Corporation (IFC), 2002.

IFC. Padrão de Desempenho 5 - Aquisição de Terra e Reassentamento Involuntário. Corporação Financeira Internacional. Washington, 2012.

IFC. Public-Private Partnership Impact Stories - Mozambique: Moatize Coal Deposit. International Finance Corporation. Washington D.C, 2013.

ITIE. Mozambique. Online, 2017 [2014]. Disponível em: < https://eiti.org/mozambique >. Acesso em: 17 de agosto de 2016.

ITIE MOÇAMBIQUE. Sexto Relatório da ITIEM – Anos de 2013 e 2014. Intellica. Maputo, 2015.

KOBEMBA, Claude; NHANCALE, Camilo. Coal versus Communities: Exposing poor practises by Vale and Rio Tinto in Mozambique. Southern Africa Resource Watch (SARW), 2012

KPMG. Mozambique: Country mining guide. Online. 2013.

LILLYWHITE, Serena; KEMP, Deanna; STURMAN, Kathryn. Mining, Resettlement and Lost Livelihoods: Listening to the Voices of Resettled Communities in Mualadzi, Mozambique. Melbourne: Oxfam, 2015.

LISK, Franklyn; BESADA, Hany; MARTIN, Philip. Regulating Extraction in the Global South: Towards a Framework for Accountability. High Level Panel on the Post-2015 Development Agenda, p. 1-34, 2013.

MACAMO, Elísio. Against ‘Development’. CODESRIA Bulletin, v. 3 & 4, p. 5-7, 2005.

MACUANE, José Jaime; BUUR, Lars; MONJANE, Celso Marcos. Power, Conflict and Natural Resources: the Mozambican Crises Revisited. African Affairs, p. 1-24, 2017.

MARSHALL, Judith. Structural adjustment and social policy in Mozambique. Review of African Political Economy, v. 17, n. 47, p. 28-43, 1990.

MASCHIETTO, Roberta Holanda. Beyond Peacebuilding: the Challenges of Empowerment Promotion in Mozambique Londres: Palgrave Macmillan, 2016.

MATOS, Elmer Agostinho Carlos de; MEDEIROS, Rosa Maria Vieira. Exploração do Carvão Mineral de Benga em Moçambique e a Expropriação da Terra dos Nativos: alguns apontamentos referentes à acumulação por espoliação. Revista NERA, v. 28, p. 106-131, 2015.

MINISTÉRIO DOS RECURSOS MINERAIS. Contrato minerio relativo a concessão mineira da mina de carvão de Moatize entre Governo da República de Moçambique e Rio Doce Moçambique Limitada. Governo da República de Moçambique. Maputo. 2006.

MOSCA, João; SELEMANE, Tomás. El Dorado Tete: Os Mega Projetos de Mineração. Centro de Integridade Pública. Maputo, 2011

NEWITT, Malyn. Mozambique In: CHABAL, P. (Ed.). A History of Postcolonial Lusophone Africa Londres Hurst & Company, 2002 p.185-235.

NHAMIRE, Borges; MATINE, Jorge. Parcerias público-privadas: um investimento necessário, mas problemático em Moçambique - caso da concessão do Porto de Nacala e Linha do Norte Centro de Integridade Pública. Maputo, 2015.

NUCIFORA, Antonio M. D.; SILVA, Luiz A. Pereira da. Rapid Growth and Economic Transformation in Mozambique, 1993–2009. In: CHUHAN-POLE, P. e ANGWAFO, M. (Ed.). Yes Africa Can: Success Stories from a Dynamic Continent. Washington DC: The World Bank, 2011. p.65-80.

PHIRI, Madalitso Zililo. The political economy of Mozambique twenty years on: A post-conflict success story? South African Journal of International Affairs, v. 19, n. 2, p. 223-245, 2012.

PLOEG, Lidewij van der; VANCLAY, Frank; LOURENÇO, Ivo. The responsibility of business enterprises to restore access to essential public services at resettlement sites. In: HESSELMAN, M.;WOLF, A. H. D., et al (Ed.). Socio-Economic Human Rights in Essential Public Services Provision (Human Rights and International Law). Cambridge: Routledge, 2017. p.168-190.

PNUD. Mozambique 2005 - Report on the Millennium Development Goals. Governo de Moçambique e PNUD. Maputo, 2005.

PNUD. Human Development Report 2016: Human Development for Everyone. United Nations Development Programme. New York, 2017.

REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE. Regulamento sobre o Processo de Reassentamento Resultante de Actividades Económicas. República de Moçambique. Maputo, 2012

ROSS, Doris C., Ed. Moçambique em Ascensão Construir um novo dia. Washington: Fundo Monetário Internacionaled, 2014.

ROSSI, Amanda. Moçambique, o Brasil é aqui. São Paulo: Editora Record, 2015.

SANTOS, Andre Almeida; GALLARDO, Glenda; FILIPE, Manuel. Mozambique. African Economic Outlook. Online. 2017.

SANTOS, Andre Almeida; ROFFARELLO, Luca Monge; FILIPE, Manuel. Mozambique 2016: African Economic Outlook. AfDB, OECD, UNDP. Online. 2016.

SELEMANE, Tomás. Aguns Desafios na Indústria Extractiva em Moçambique. Centro de Integridade Pública. Maputo, 2009.

SELEMANE, Tomás. Questões à volta da mineração em Moçambique - Relatório de Monitoria das Actividades Mineiras em Moma, Moatize, Manica e Sussudenga. Centro de Integridade Pública. Maputo, 2010.

SELEMANE, Tomás. Tete e Cateme: entre a implosão do El Dorado e a contínua degradação das condições de vida dos reassentados. Observador Rural, v. 45, p. 1-29, 2016.

STEGER, Manfred B.; ROY, Ravi K. Neoliberalism: A Very Short Introduction. Oxford: Oxford University Press, 2010.

TOLLENAERE, Marc De. Ajuda Internacional, Dependência Externa e Governação. In: NUVUNGA, A. e TOLLENAERE, M. D. (Ed.). Governação e Integridade em Moçambique: Problemas práticos e desafios reais. Maputo: Centro de Integridade Pública, 2013.

UNITED NATIONS. Guiding Principles on Business and Human Rights: Implementing the United Nations "Protect, Respect and Remedy" Framework, 2011.

UNITED NATIONS ECONOMIC COMMISSION FOR AFRICA. Minerals and Africa’s Development: The International Study Group Report on Africa’s Mineral Regimes. Addis Ababa, 2011.

VALE S.A. Relatório de Sustentabilidade 2010. Vale. Rio de Janeiro, 2011.

VALE S.A. Vale: Nossa História. Rio de Janeiro: Verso Brasil, 2012.

VALE S.A. Competitividade do negócio do carvão em Moçambique. Maputo, 2014a.

VALE S.A. Sustentabilidade Moçambique 2013. Vale. Maputo, 2014b.

VALE S.A. Formulário de Referência - 2016. Rio de Janeiro, 2017.

VASCONCELOS, L.; MUCHANGOS, A; SIQUELA, E. Elementos-traço em cinzas de carvões aflorantes de Moçambique. Geochimica Brasiliensis, v. 23, n. 3, p. 344-361, 2009.

XIONG, Yi. O papel dos mega projetos e o seu peso no emprego e no crescimento. In: ROSS, D. C. (Ed.). Moçambique em ascensão: construir um novo dia. Washington: Fundo Monetário Internacional, 2014. p.29-40.

Lista de entrevistados/as

Moçambique – Mo

População Atingida (Pop)

Pop-Mo-1: Reassentado/a do 25 de setembro, Vila de Moatize (Tete), 7 de julho de 2016.

Pop-Mo-2: Reassentado/a do 25 de setembro, Vila de Moatize (Tete), 7 de julho de 2016.

Pop-Mo-3: Reassentado/a de Cateme, Cateme (Tete), 6 de julho de 2016.

Pop-Mo-4: Reassentado/a de Cateme, Cateme (Tete), 6 de julho de 2016.

Pop-Mo-5: Reassentado/a de Cateme, Cateme (Tete), 6 de julho de 2016.

Pop-Mo-6: Reassentado/a de Cateme, Cateme (Tete), 6 de julho de 2016.

Pop-Mo-7: Reassentado/a de Cateme, Cateme (Tete), 6 de julho de 2016.

Sociedade Civil (SoCiv)

SoCiv-Mo-1: Representante da ONG Justiça Ambiental, Maputo (Maputo), 13 de julho de 2016. SoCiv-Mo-2: Representante da ONG Justiça Ambiental, Maputo (Maputo), 13 de julho de 2016. SoCiv-Mo-6: Representante da Liga Moçambicana dos Direitos Humanos, Vila de Moatize (Tete), 5 de julho de 2016.

SoCiv-Mo-7: Representante da AAAJC, Vila de Moatize (Tete), 5 de julho de 2016.

SoCiv-Mo-8: Pesquisador/a do Centro de Integridade Pública, Maputo (Maputo), 11 de julho de 2016.

SoCiv-Mo-10: Pesquisador/a do Observatório do Meio Rural, Maputo (Maputo), 13 de julho de 2016.

SoCiv-Mo-11: Pesquisador/a do IESE, Maputo (Maputo), 15 de julho de 2016.

SoCiv-Mo-13: Ativista, Maputo (Maputo), 1 de julho de 2016.

SoCiv-Mo-14: Ativista, Vila de Moatize (Tete), 5 de julho de 2016.

Corporação Multinacional (CMn)

CMn-Mo-1: Funcionário/a da Vale, Maputo (Maputo), 28 de junho de 2016.

CMn-Mo-2: Funcionário/a da Vale, Vila de Moatize (Tete), 8 de julho de 2016.

Governo (Gov)

Gov-Mo-1: Membro do Ministério da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural, Maputo (Maputo), 18 de junho de 2016.

Consultoria (Consult)

Consult-Mo-1: Consultor/a da Impacto, Maputo (Maputo), 14 de julho de 2016.

Downloads

Publicado

2018-12-05

Como Citar

Lamas, I. (2018). UM CASO DE SUCESSO? POLÍTICAS NEOLIBERAIS, SETOR EXTRATIVO E CORPORAÇÕES PRIVADAS ENQUANTO AGENTES DE DESENVOLVIMENTO EM MOÇAMBIQUE. Cadernos Do CEAS: Revista crítica De Humanidades, (245), 395–426. https://doi.org/10.25247/2447-861X.2018.n245.p464-495

Edição

Seção

Artigos

Artigos mais lidos pelo mesmo(s) autor(es)

Obs .: Este plugin requer que pelo menos um plugin de estatísticas / relatório esteja ativado. Se seus plugins de estatísticas fornecerem mais de uma métrica, selecione também uma métrica principal na página de configurações do site do administrador e / ou nas páginas de configurações do gerente da revista.