ALÉM DO EUCALIPTO: O PAPEL DO EXTREMO SUL

Autores

  • José Koopmans

DOI:

https://doi.org/10.25247/2447-861X.2006.n222.p45%20-%2058

Resumo

Ao entregar no dia 30 de junho de 1989, o licenciamento do Conselho Estadual de Meio Ambiente (Cepram) para o início das obras da fábrica de celulose e papel da empresa Bahia Sul Celulose (BSC), o então governador da Bahia, Nilo Coelho, considerou o lançamento do pólo de celulose da mais alta importância por gerar empregos e ser uma grande fonte do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) para o Estado. Dirigindo-se ao presidente do grupo Suzano Papéis, Nilo Coelho destacou que entregava a licença na certeza de que vinha contribuir para o nosso desenvolvimento e progresso. Assim foi a reportagem nos jornais. Foi uma notícia aparentemente de menor importância, sequer saindo na primeira página do jornal A Tarde, praticamente o único jornal estadual que circulava na época na região. Mas aquela notícia e acontecimento chamaram a atenção de pelo menos algumas pessoas do local. Já havia uma grande preocupação, por parte dos Sindicatos de Trabalhadores Rurais (STRs), com relação ao abandono do Estado para com o setor da agricultura, em particular com os inúmeros proprietários que viviam da produção familiar e passavam por uma crise profunda. Muito preocupados com o crescimento acelerado da marginalidade e miserabilidade regionais, o Centro de Defesa dos Direitos Humanos do Extremo Sul da Bahia (CDDH) e o Pólo dos STRs mostraram interesse em dar maior atenção à implantação de um pólo de celulose na região. Na medida em que a construção da fábrica avançava, aumentavam também as preocupações destes dois setores da sociedade civil, que sentiram a necessidade de buscar orientações externas. Foram criados, portanto, os primeiros contatos com os Sindicatos dos Trabalhadores do Setor da Extração de Madeira do Espírito Santo, como também com a Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase), em Vitória (ES). Depois de várias reuniões, os representantes dessas duas regiões (Extremo Sul da Bahia e Norte do Espírito Santo) acharam importante que fosse feito um estudo e uma análise profundos sobre a nossa realidade em comum, tendo em vista o entendimento do que estava acontecendo. Os contatos foram aumentando e, daí para frente, o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE) e a Fase Nacional tiveram um papel importante na análise do modelo de desenvolvimento do qual estávamos sendo “vítimas”. Pesquisadores destas duas Organizações Não-Governamentais (ONGs) trabalharam durante alguns anos, sempre em contato e fazendo reflexões regulares conosco, com o intuito de estudar e analisar tal processo de desenvolvimento, especificamente a indústria de celulose e papel. O Centro de Estudos e Pesquisas para o Desenvolvimento do Extremo Sul (Cepedes), uma ONG com sede em Eunápolis (BA), decidiu, na sua assembléia anual de 1991, dar prioridade ao desenvolvimento regional. A partir deste momento, o Cepedes e o CDDH tornaram-se os principais articuladores, no Extremo Sul da Bahia, do acompanhamento crítico da implantação das grandes empresas da indústria de celulose e papel, como BSC, Veracruz e Aracruz. Estudamos profundamente toda a problemática sócio-econômica, ambiental, fiscal, fundiária e industrial, aproveitando também os estudos específicos feitos por Múcio Tosta, da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de Belo Horizonte (MG), e os resultados dos trabalhos e análises do IBASE e da Fase, buscando, podemos dizer, no mundo inteiro, informações sobre os eventuais danos ambientais trazidos potencialmente por estas indústrias. Sempre tivemos um expressivo apoio do Grupo Ambientalista da Bahia (Gambá), que, com competência, dedicação e independência, não somente acompanhava o processo de licenciamento dessas empresas, como representante dos ambientalistas no Cepram, como também socializava conosco todas as informações e conhecimentos disponíveis. Através de um grande levantamento realizado em toda a região sobre o que a sociedade em si e vários setores em particular pensavam acerca da implantação desses megaprojetos de celulose e papel na região, chegamos a ter contatos com outras entidades e organizações na região, as quais entravam, por assim dizer, no grupo da “oposição”, ou melhor, no grupo que tentava analisar criticamente o processo de desenvolvimento em vigor. O Movimento de Defesa de Porto Seguro, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), a Organização dos Advogados do Brasil (OAB/Secção Porto Seguro), representantes dos moradores em Trancoso, o STR de Belmonte e o Movimento de Defesa dos Pataxós, entre outros, assumiram nossa bandeira de luta. Constituímos, assim, o chamado Grupo Crítico. É claro que, perante esta organização da sociedade civil, as empresas não ficaram com os braços cruzados. Muito pelo contrário, através de uma grande propaganda, muitas vezes enganadora e sem nenhuma ética, tentavam influenciar e ganhar a opinião pública. Além disso, começaram a tecer sua teia de apoio. No decorrer desse artigo veremos que essa rede de empresas era composta por membros do próprio governo ou dos órgãos governamentais, pela classe política em geral (especialmente os políticos ligados aos governos municipais da região), pelo poder judiciário e até por certos grupos ambientalistas, como Ascae (de Santa Cruz Cabrália), Gérmen (de Salvador), Grama (de Itabuna) e Papamel (de lpiaú), que, neste caso, tomaram uma postura vergonhosa no processo de licenciamento destas empresas. Finalmente, conquistaram também pequenos setores ou segmentos da classe trabalhadora regional, de maneira a complementar a construção de sua teia. Mas não podemos deixar em branco o primeiro trabalho feito pelo Grupo Crítico, que foi o levantamento da opinião pública sobre a implantação destas grandes empresas.

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Publicado

2016-06-17

Como Citar

Koopmans, J. (2016). ALÉM DO EUCALIPTO: O PAPEL DO EXTREMO SUL. Cadernos Do CEAS: Revista crítica De Humanidades, (222), 45–58. https://doi.org/10.25247/2447-861X.2006.n222.p45 - 58

Edição

Seção

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